segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

E a luz se fez...

Uma das partes que mais me cativaram a emoção em A Invenção de Hugo Cabret, livro de Brian Selznick, foi quando Prometeu aparece em pintura na entrada da cinemateca francesa. Ao doar ao luz à humanidade, numa das maiores transgressões mitológicas da história do universo, ele teria, consequentemente, permitido o surgimento do cinema. 

Ao tomar conhecimento da adaptação desse livro, um presente querido da Rita, que vive e trabalha entre os livros, o receio e a suspeita foram grandes. Tudo bem, o projeto estava sob a direção de Martin Scorcese, mas para mim nem ele seria capaz de traduzir em sons em imagens o que, para mim, já era perfeito e cinematográfico em papel, tinha e letras.

Após assistir a A Invenção de Hugo Cabret (Hugo. Martin Scorsese, US, 2011) duas vezes no cinema - uma delas na tela gigantesca do Cinemark, num 3D maravilhosamente bem utilizado - eu tive de dar o meu braço a torcer mil vezes. Na primeira vez em que o vi, a emoção foi constante, e as lágrimas vieram em vários momentos.

A emoção veio pelo reconhecimento. Se o livro parece um filme, em seus planos-sequência cinematográficos, em que a imagem não ilustra, mas é narrativa tanto quanto as palavras, o filme traz o livro constantemente para si, em imagens que voam na tela, em planos-sequência no papel que se descortinam diante dos nossos olhos. 

Depois de assistir a Orgulho e Preconceito, de Joe Wright (2005), fiquei com o sentimento de que um diretor, para poder adaptar bem um livro, precisaria ser também um bom leitor. E, principalmente, deveria ter pelo livro que adapta um respeito muito grande, se não um carinho especial. Scorsese foi um excelente leitor em Hugo. Assim, o livro que adoro e que me trouxe muita inspiração não foi repicado no cinema. Pelo contrário, ele cresceu, expandiu-se e conseguiu crescer para mim.Seus personagens também cresceram, e se tornaram ainda mais fortes e queridos pelas imagens e sons do filme.

O ponto-chave para que eu me sentisse assim foi justamente a forma como o quadro de Prometeu aparece no filme... Tão lindo, uma leitura que encontrou a minha própria, a imagem não precisou das palavras do livro para se fazer incrível. 

Dos dedos de Prometeu, expande-se a luz em projeção, diante da tela do mundo, habitado pelos seus espectadores, seres humanos que, como diz Meliés, são  - somos! - sereias, sonhadores, aventureiros...

Personagens de um sonho de cinema que é a vida.



PS: Li, esses dias, como o Oscar ressaltou filmes que traziam, em si, um saudosismo grande pelo chamado primeiro cinema. O Artista e Hugo Cabret trazem o início do cinema de forma diferente, mas que os críticos têm considerado saudosista. A própria cerimônia do Oscar, realizada ontem - na qual Hugo levou 5 estatuetas -, marcou essa época do cinema em seus cenários e figurinos.


Aqui eu gostaria de contrapor um ponto de vista: não creio só que seja saudosismo o que esses filmes trazem. Em nenhum momento senti que eles diriam como esse cinema era melhor ou superior ou mais puro, por exemplo - aspectos presentes no saudosismo - que o atual. Para mim, eles utilizam-se do que o cinema tem de mais incrível - seus filmes e cineastas e o amor dos espectadores e estudiosos do cinema - para contar de si mesmo. Para dizer da sua essência mais transformadora, a criação do ser humano e a projeção dos sonhos e mitos mais caros à humanidade. Hugo Cabret, o menino órfão que procura seu lugar no mundo, encontra com sua essência com o cinema. Sua ligação com o que tem de mais precioso, sua origem, é o cinema. De uma invenção do cinema para outra, rs, eu creio que dois filmes específicos ultrapassam o mero saudosismo e alcançam o cinema em sua beleza mais flagrante.  

E, assim sendo, como esse filme não teria um post só para si? 

2 comentários:

  1. Eu ainda ouvi críticas no sentido de que a academia teria privilegiado filmes "bons de técnica" em relação a filmes "que emocionam".

    A emoção vem do olhar do espectador, não é? Hugo muito me emocionou também!!!

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    1. Kakal, há tempos já desisti de ler críticas sobre filmes ou premiações - exceto, claro, o que aparece no E Online, rs. Quando preciso muito saber sobre um filme, procuro os comentários dos usuários do www.imdb.com Da mesma forma, quando quero saber de um livro, olho as críticas dos leitores no site da Amazon. Eles acabam sempre chegando mais perto do que eu sinto...

      Hugo é uma história especial para mim, e sua adaptação no cinema foi brilhante, thanks god Scorsese, rs. Mas isso sou eu, né?, a pessoa que racionaliza pouco e sente muito no escuro do cinema.

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